22 de jan. de 2017

PRAZER E BRUTALIDADE



O maior amor é o não correspondido. Cresce para aumentar avidez da carne; tortura para valorizar o prazer. [Honoré de Balzac]

Era dezembro de 2015, eu fazia mais uma temporada na capital, desta vez eram 12 dias consecutivos hospedado num flat próximo ao mais importante centro econômico de São Paulo, Avenida Paulista. O sexo em São Paulo é um exercício diário, por mais natural que possa parecer o sexo pago tornava-se um meio de sobrevivência e assim como um executivo que enfrenta transito, reuniões e uma rotina árdua no escritório, um garoto de programa tem sua rotina preso ao quarto de hotel revezando clientes. Com o tempo o corpo assimila um tipo de cartografia onde cada ponto tocado estimula um prazer e uma sensação, muitas vezes eu via um corpo como um mapa com rotas a serem exploradas. Engraçado não? Pode parecer mecânico, mas o exercício de certas atividades nos levam a catalogar movimentos, como numa linha de produção, na qual você executa rotineiramente as mesmas ações e sabe perfeitamente como executa-las.
  
Foram dias de muito movimentado com picos de até cinco clientes ao dia, meu corpo entrava em estado de prontidão a cada programa agendado, o que me salvou da solidão e depressão era estar em companhia do meu amigo Paco Gianetti, outro garoto de programa com que eu viajava. Revezávamos-nos no uso do quarto, além disso boa parte dos programas agendados eram realizados fora do flat, a domicilio ou em algum motel. Foi num desses agendamentos externos que conheci de forma impessoal um rapaz chamado Érico. Ele havia agendado um programa com Paco, que ao retornar para o flat tinha marcas por todo o corpo. Encontrei meu amigo todo dolorido, com marcas roxas de cinto e tapas, suas nagedas parecima duas almofadas roxas, tamanho eram os hematomas. Érico é um jovem cadeirante que tinha fetiche por hábitos de sadomasoquismo com requintes de violência profunda.

Segundo Paco o rapaz gostava de torturar e bater sem medir a força que empregava nos objetos utilizados, como cintos, cordas e mãos. Os resultados foram inúmeros hematomas que deixaram meu amigo dois dias de molho. Paco só aguentou a sessão de tortura pelo valor pago e por ter um porte maior do que o meu, ele possui quadril largo e bunda grande, sem contar nas costas e pernas grossas. Mesmo assim Paco disse que não voltaria a repetir a experiência.

Mesmo com pena do meu amigo fiquei intrigado por Érico e por seu fetiche, talvez eu aguentaria aquela sessão de tortura, doía só imaginar, mas ao mesmo tempo isso me excitava, tanto que disse a Paco que em caso de nova solicitação ele poderia me indicar, isso seria um desafio para mim. A temporada passou, fechamos a viagem com saldo mais que positivo e voltamos para nossas respectivas cidades. Lembro que antes passei em Curitiba para um último trabalho em 2015.

Meses depois, meados de julho de 2016 anuncie nova temporada em São Paulo, e dentre as inúmeras solicitações estava uma de Érico. Ele disse que havia sido indicado por Paco e queria fechar um encontro para realizar sua sessão de tortura. Nossos contatos aconteciam via whatsapp. Entretanto, mesmo com certo interesse Érico mostrava-se receoso por um encontro comigo, ele dizia duvidar da minha capacidade de aguentar seus fetiches pelo meu porte menor. As conversas não evoluíam muito, pareciam papos em circulo com as mesmas perguntas.

Érico: Você vai se vender por inteiro?

Érico: Especifique se vender “por inteiro”.

Érico: Quero te bater com cintos, amarrar, dar tapas na cara, no corpo. Sem limites!

Eduardo: No rosto eu não topo. Você pode bater no corpo, desde que não exagere deixando marcado como deixou meu amigo Paco.

Érico: Não sei se você vai aguentar. Eu gosto de bater forte.

Eduardo: Mas você curte pegação, beijos? Eu gostaria de conhecer esse lado, além da violência.

Érico: Sim, vou bater e depois transar com você.

As conversas se estenderam por dias, sempre com indícios que nos garotos de programa chamamos de “cliente caroço”, aquele perfil de cliente que nunca fecha nada, dividido em três estágios é possível detectar que trata-se de um falso programa. Estágio 1: O suposto cliente  liga ou chama por mensagem de texto com perguntas básicas: onde atende? Quanto cobra? Etc... – Estagio 2: A partir dessas respostas ele passa a falar de suas fantasias sexuais em textos longos, incluindo o envio de fotos de sua genitália ou vídeos garimpados na internet. Estágio 3: No dia seguinte ou horas depois ele retorna ao estágio 1, como se reiniciasse todo o processo.


O DESAFIO
Os dias se passaram e fui embora de São Paulo sem fechar nada com Érico. Entretanto eu queria entender o motivo pela sua tara por violência e passamos a conversar quase que diariamente. Em todos os diálogos era notório o discurso dominador de quem gosta de violentar o outro.
Apesar de seu gosto por violência Érico era um rapaz amigável, jovem e muito bonito de rosto, tinha traços fortes. Sua deficiência se deu por conta de um acidente de moto, desde então não recuperou os movimentos das pernas, mesmo assim não limitou ter sua independência, mora sozinho em um bairro nobre de São Paulo e trabalha na área de tecnologia da informação. Com nossos contatos cada vez mais corriqueiros sua fissura pelo lado sádico foi sendo desarmada com demonstrações de afeto.

Érico: Oi, tudo bem?

Eduardo: Bem e você?

Érico: Senti sua falta, como foi seu dia?

Eduardo: Corrido, muito trabalho, não parei em casa.

Érico: Você ainda vai deixar eu bater em você?

Eduardo: Sim, se você quiser...Somente o rosto que não vou concordar.

Érico: Não sei se você vai aguentar apanhar, mas quero te beijar.

Eduardo: Vou adorar conhecer esse seu lado.

Érico: Você é diferente. Você faz eu ver um outro lado...

Os meses se passaram e mantivemos contato com a cobrança dele para uma viagem a São Paulo. Por conta de um contrato de trabalho eu não tinha tempo livre para temporadas e passei atender somente em São José dos Campos e cidades próximas. Sempre aos finais de semana Érico me cobrava uma possível viagem a São Paulo, ou dizia que viria a São José dos Campos, mas eu duvidava e também não queria nada apressado, visto sua dificuldade para deslocamento e também por não me sentir preparado para atender seus desejos, mesmo tento quebrado a casca dura do jovem rapaz, ele ainda nutria o desejo de violência. Não que eu quisesse desarmar isso nele, afinal entendo o fetiche como uma vontade própria, a qual é saudável realizarmos, mas não queria ser um saco de pancadas sem algum limite estabelecido.
Mesmo assim a investigação continuava...

Eduardo: Você já namorou algum homem?

Érico: Por que, quer namorar comigo? Namora comigo!

Eduardo: Você é um cara interessante, mas não daria certo. Você gosta dar surras, eu jamais aguentaria isso.

Érico: Se você namorar comigo eu não vou te bater, você terá só meu carinho.

Eduardo: Não é essa a questão, quero saber se você namorou e como era.

Érico: Sim, já namorei um cara, mas terminamos por que precisei vir embora para São Paulo por conta do meu trabalho.

Eduardo: Na época você já era cadeirante?

Érico: Sim...

Eduardo: Você também batia nele?

Érico: não batia, era diferente. Só faço isso fora de relacionamento.

Eduardo: Mas se você gosta, se isso te excita e da tesão, por que não bater? Acho que ta sendo desonesto escondendo isso de um namorado, poderiam chegar num consenso, muitos casais gostam de algo mais sado, dominação...claro que havendo um limite.

Érico: Eu sei, mas eu bato por que tenho raiva, revolta...

Eduardo: Raiva do que?

Érico: Não sei, raiva... mas isso passa, com você eu não tenho essa vontade.

Eduardo: Perdeu o tesão em mim?

Ao entender um pouco sobre o desejo de Érico em externar a raiva que sentia pela peça que a vida lhe pregou, compreendi que não se tratava de um fetiche ligado somente ao prazer, mas de um sentimento de revolta pela condição na qual ele se encontrava. Embora ele seja um rapaz resiliente é algo que realmente muda nossas sensações. Mesmo assim Érico não deixou de ser um rapaz interessante. Com o passar dos meses nossos contatos ficaram cada vez mais estreitos e por mais de uma vez Érico se propôs a algo além do campo profissional comigo. Sempre teve minha recusa por entender que jamais iria suprir suas necessidades. Certa vez depois de tanta insistência dele cheguei a marcar uma pernoite, na qual eu viajaria numa sexta-feira para São Paulo e voltaria no sábado. Marquei hotel, verifiquei horário de ônibus com a condição dele confirmar tudo no dia. Érico não confirmou, como não respondeu as minhas mensagens, prevendo o incerto eu na última hora cancelei o hotel que devolveu o valor da daria. Érico apareceu depois no whatsapp e pediu desculpas pelo ocorrido. Prometi que só marcaríamos algo quando eu fosse em temporada para São Paulo.


Dezembro de 2016

Como de costume programei uma temporada em São Paulo aproveitando o período de férias, desta vez na cia de Caio e Daniel, dois integrantes do grupo White Boys, como de costume dividíamos o quarto durante nossa viagem e fazíamos uma escala de atendimento de acordo com os clientes marcados, tanto para atendimentos individuais como em grupo.

Érico: Você vai vir me ver? Vai ficar comigo?

Eduardo: Estou indo em temporada, para programas.

Érico: Já que vira como garoto de programa eu quero fechar um pernoite com você, quero que você se venda inteiro pra mim!

Érico marcou uma data, seria uma pernoite. No acordo do programa ele iria realizar seu fetiche utilizando cinto, cordas, daria tapas e mordidas, incluindo o corpo todo, com a regra de não deixar marcado de forma exagerada e ao final rolaria sexo. Na data marcada entrei em contato via whatsapp e Érico mais uma vez ficou de confirmar, era sexta-feira a noite, Caio e Daniel haviam saído para um bar e como havia esse compromisso fiquei preso no hotel. Passou quase duas horas do prazo combinado e Érico não deu sinal de vida, como não havia um plano B, decidi que se algum cliente me ligasse eu atenderia, visto o cancelamento de Érico.

O celular tocou, era Cássio, um cliente de Campinas que estava em São Paulo e perguntou se eu poderia antecipar nosso encontro para aquela noite. Confirmei o horário e como estava pronto avisei que ele poderia ir ao meu encontro, assim que Cássio chegou recebo uma mensagem de Érico:

Desculpe sumir, estou a caminho do hotel, devo chegar em 40 minutos.

Assustado e ao mesmo tempo irritado pelo sumiço de Érico me vi numa saia justa, dois clientes a caminho e eu tendo que contornar esse imprevisto. Peguei o celular e passei uma mensagem para Érico explicando que estava fora do hotel, visto o sumiço dele e minha espera de quase duas horas do período combinado, avisei que havia saído para jantar e deveria chegar em 1h30. Embora ele não tivesse gostado eu deixei claro que a omissão partiu dele. Enquanto isso Cássio avisou que estava na portaria do hotel. Recebi Cássio normalmente e como havia mais de um ano que não nos víamos, ele quis conversar um pouco para depois partirmos para o sexo. Cássio não curtia nada apressado então precisei agir de forma natural ao passo que ouvia o celular vibrar discretamente com as cobranças de Érico.

Ao termino do programa notei que não conseguiria chegar em 1h30 e disse que já estava a caminho, enquanto na verdade me arrumava para sair do hotel. O motel marcado por Érico era bem distante, mesmo com UBER só de trajeto foram 30 minutos.

Ao chegar na porta da suíte, tire a roupa, fique de joelhos, só de cueca com o cinto em volta do pescoço. Disse ele por mensagem de texto.

Haviam passado duas horas do combinado, a essa altura eu já imaginava o que estava por vir. Cheguei ao motel, me dirigi ao quarto, entrei pela porta da garagem, tirei minha roupa e como ordenou fiquei de joelhos, usando cueca com o cinto em volta do pescoço. Bati na porta e esperei...
Um minuto depois a porta se abriu, como estava de cabeça baixa eu só pude ver um faixo de luz e ouvir o som da cadeira que se aproximava...


CONTINUA...


O garoto errado