Não há fatos eternos, como não há verdades absolutas [Friedrich
Nietzsche]
Desde que resolvi enterrar Eduardo White minha vida tomou
outros rumos. Novo emprego, novo cotidiano, novo curso, novas pessoas, um
carro usado e muita disposição para novos caminhos. Mas quando tudo parece ir
bem, sempre há algo que nos tira do eixo, como num jogo de equilíbrio para testar
nossos limites de adaptação.
Depois de seis meses sem programas eis que a sombra de
Eduardo voltou a me perseguir. Não sei por qual motivo. Financeiramente não
tenho mais problemas, mal gastei o que ganhei em quase dois anos como garoto de
programa, abri uma poupança e paralelo a essa quantia guardada, eu, como a
maioria dos mortais tenho um salário fixo que me garante certas comodidades e
alguns direitos.
Muitas pessoas acreditam que uma vez garoto de programa
dificilmente você sairá dessa condição. Eu não acredito nisso, mas sei que como
todo vício há o período de abstinência, o risco de recaída e o exercício diário
de superar certas fraquezas. Eu confesso que tenho fraquejado, o resultado
disso foi que voltei em parte ser Eduardo White.
Tudo recomeçou quando decidi ligar meu celular com o chip
antigo para ver o que havia gravado nele, algumas mensagens antigas caíram na
caixa de entrada, muitas delas com meses, até ai tudo bem. Eu sempre recebo
e-mails de ex-clientes querendo saber sobre minha vida e como estou indo nessa
nova fase. Mas eis que minutos depois um rapaz de outra cidade me chamou no
whatsapp. Disse que havia lido meu blog, que acompanhou quase toda minha
trajetória e resolveu tentar contato comigo. Ele é um rapaz jovem, atraente e
comunicativo.
Posso lhe fazer uma pergunta?
Sim, pode.
Eu li que você parou... Li tudo que houve, mas você topa
sair comigo?
Estático eu apenas olhava para a tela do celular até que uma
hora depois esse rapaz me encontrou para um programa. Foi maravilhoso e
estranho em alguns aspectos. Por um lado eu me sentia vivo por experimentar um
gosto e uma adrenalina que há tempos eu não “experenciava”. Já a
estranheza da situação era por parecer que muitas lembranças voltavam a tona...
O mais engraçado que o que me moveu até aquele quarto de motel não foi o
dinheiro, isso pra mim ficou em segundo plano. Felizmente isso não é mais
problema devido as mudanças benéficas que ocorreram em minha vida. Eu só quis a
sensação de ser outro, ter um momento de fuga de quem eu era, de quem eu sou
atualmente.
O fato de ter cedido em algum ponto não me deixa triste e
nem alegre com a possibilidade de voltar a fazer programas. Não considero que
ainda voltei, pois não pretendo fazer de Eduardo White uma prioridade em minha
vida. De fato ele foi importante e ainda é. Ele como ninguém me ensinou coisas,
me fez crescer no sentido de viver e compreender certas angustias que temos.
Mas seu período mais forte dentro de mim passou, está passando.
Meu planejamento inicial era permanecer três anos fazendo
programa e desde que Eduardo White nasceu passaram-se 2 anos e 9 meses para
fechar o ciclo que programei. Por que três anos? Não sei, mas três para mim
sempre foi um número que gostei. O três é ligado em muitas questões desde arte
a religião. Nas comédias populares são sempre três inserções para uma piada, o
três aparece na santíssima trindade, na lei são três os poderes, jurídico,
executivo e legislativo, três é o número simbólico do equilíbrio e união.
Talvez Eduardo White ainda tenha três meses de vida... Ainda
não posso afirmar. Talvez seja só uma recaída que eu supere daqui alguns dias. O
que sei é que tudo ainda é incerto para mim. Por hora preciso dormir, meu eu
mesmo agora rege meus dias. Eduardo White parece ter voltado para apenas para
uma breve visita...
O garoto errado